sábado, 5 de março de 2011

Outono

Não consigo tirar meus olhos daquela casa velha. Passaram-se mais de três anos desde que ele se foi, os dias estão se passando e o tempo está se esvaindo em minhas mãos, escorregando no meu desespero como areia da praia. A casa velha continua ali. Ainda não entendi porque não quiseram vende-la, talvez seja algum egoísmo de minha parte pensar que deveriam se desfazer dela somente porque não consigo me desfazer dessas lembranças. Tentei, e venho tentando mas algo me leva até ali. Eu poderia encontrar milhões de motivos para condenar o que me leva até aquele lugar. Talvez seja a grande árvore que nos deu abrigo das chuvas de Julho. Ele não era daqui. Vir para a Munique não foi uma decisão muito fácil. Acostumar-se com o clima, o comportamento individual e, porque não, egoísta das pessoas daqui não seria nada confortável. Mas foi em um dia de verão que o vi pela primeira vez. O seu olhar tinha algo em especial. Sabia exatamente onde aquele olhar me levaria e procurei fugir, negar a mim mesma, mas esse era o meu conforto. Parecia muito simples, puro, talvez até inocente. Meu amor, nosso amor .. não fazia mal algum a ninguém. Sempre gostei das flores, do jardim de sua casa, e principalmente da grande árvore. Adorava as primaveras, mas algo me chamava atenção no outono. O outono fica tão perto da perfeição .. é um pouco de despedida. O outono me permitia abraça-lo mais, e ao mesmo tempo me afastar para olhar seus olhos sem sentir o ar congelar meu rosto. Outono era um pouco de tristeza e alegria, conforto e desespero, encontro e despedida .. A visão era bastante agradável, a cor das folhas, do céu, era pouco como seu olhar. Daria tudo para vê-lo novamente. Oh meu Deus, o que estou dizendo !
Quando a primavera chegava ficava feliz, mas o outono me deixava mais proxima a ele, como se fossemos um. O ultimo dia em que o vi era uma tarde de outono. Ventava muito. Eu estava vestindo seu casaco marrom. Às vezes fazia de propósito, saia de casa sem agasalho para que ele me emprestasse o dele. Uma forma de proteção, nada poderia me atingir quando vestia-o. Sinto seu cheiro nele, a proteção se foi .. o cuidado também. Me vejo parada olhando a grande árvore quando passo por aqui. Escuto o silêncio. Sinto o desprender das folhas nos galhos até seu cair no chão. As flores se desfazem como pó ao vento. Não sei exatamente onde ele está e talvez seja por isso que não deixo de vir aqui. A guerra já acabou há alguns meses. Não é justo! Você me prometeu voltar. Sei que manter essa chama acesa em meu peito me traz mais dor. Mas não vou duvidar do que meu coração me diz, ele disse que me amava, ele me ama. Ele me deu asas quando eu era alguém que levava tombos demais, agora eu sei voar. Me ensinou o amor quando eu não podia conviver com ele. Eu ainda acredito.
A ultima folha do outono caiu. Já se foram três outonos, mas vou continuar esperando as estações. Esperar é amar. Eu poderia te amar por mil anos, e desejar te amar mil anos mais.

Analu Oliveira

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